segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Amálgama e contaminação mercurial: saiba mais e proteja-se!

Artigo cedido pela Dra. Sheila Oliveira Correa
Publicado originalmente em 
Referências


O amálgama de prata é um material restaurador amplamente utilizado na Odontologia devido a algumas de suas propriedades físicas e mecânicas, ao fácil manuseio e baixo custo, apesar da alta toxicidade do mercúrio em sua forma metálica, de seu uso restrito ou proibido em alguns países e da estética desfavorável. 

Este artigo tem o intuito de falar sobre a contribuição do amálgama dentário para a contaminação dos profissionais da Odontologia e do meio ambiente, pela presença do mercúrio, sendo um meio de divulgação e conscientização, sobre o potencial tóxico desse metal.

O mercúrio ocorre naturalmente no meio ambiente e se apresenta como um metal líquido branco-prateado, recebendo nesta forma, a denominação de mercúrio ‘elementar’ ou ‘metálico’, sendo a forma mais danosa para a saúde dos trabalhadores, pois, devido à sua capacidade de volatilização em temperaturas a partir de 12°C, libera vapor metálico, inodoro e incolor que é inalado sem que a pessoa perceba. 

Diferentemente dos metais essenciais à vida, o mercúrio não faz parte da constituição normal do organismo dos seres vivos e tampouco desempenha funções nutricionais ou bioquímicas. Assim, sob qualquer forma em que se apresente, quando absorvido de forma continuada, mesmo em baixas concentrações, representa um grave risco para o homem e para os seres vivos em geral. 

O mercúrio possui efeito cumulativo, tornando-se, assim, causa de perturbação crônica e progressiva das funções metabólicas e celulares dos indivíduos que a ele estão expostos. Dessa forma, a maior parte da exposição humana ao mercúrio é de origem ocupacional. Dentre as categorias profissionais com exposição dos trabalhadores ao mercúrio destaca-se a Odontologia, devido à utilização desse metal na confecção do amálgama de prata.(1)

Apesar de ser encontrado em vários tecidos do corpo humano, os órgãos críticos da toxicidade do mercúrio são o sistema nervoso central (SNC) e os rins. O vapor inalado é rapidamente difundido em todas as membranas alveolares do pulmão para o sangue (cerca de 80%) sendo, então, distribuído para todo o organismo. Uma vez no cérebro, o mercúrio metálico é oxidado e, depois de um ano, metade da concentração do metal que chegou ao cérebro ainda está presente no local. Os vapores de mercúrio metálico e os compostos orgânicos podem afetar diferentes áreas do cérebro e suas funções associadas. 

A exposição crônica ao metal causa uma doença neurológica denominada ‘mercurialismo’ ou ‘hidrargirismo’ que se apresenta por meio de uma tríade de sintomas característicos: estomatites (gengivite, sialorréia e linha escura na gengiva marginal), eretismo (mudanças de comportamento e de personalidade: neurastenia, aumento de excitabilidade e irritabilidade, depressão, déficit de memória, delírios, alucinações, melancolia suicida, psicose maníacodepressiva) e tremores. 

Nos rins, o mercúrio se distribui entre as células ficando a maior parte (54 a 60%) ligada à proteína metalotioneína. A presença de compostos mercuriais induz a síntese da metalotioneína, processo que contribui para a bioacumulação do metal nos rins. A toxicidade renal aparece quando a metalotioneína tem sua capacidade de ligações saturada.(1) O mercúrio pode danificar, também, o fígado, e causa problemas de desenvolvimento, desordem no sistema reprodutivo, distúrbios cognitivos, prejudica a fala e a visão, causa dificuldades para ouvir e caminhar, distúrbios mentais e a morte.(2) 

Seu potencial tóxico, especialmente para os indivíduos ocupacionalmente expostos, fez com que o mercúrio fosse a primeira substância química a ser submetida a uma legislação para controle da exposição em ambiente laboral. No Brasil, a exposição a substâncias químicas é regulada por limites de exposição estabelecidos por normas regulamentadoras (NRs) do Ministério do Trabalho e Emprego e da Associação Brasileira de Normas Técnicas (NBRs) que classificam o mercúrio como substância perigosa para a saúde humana e para o meio ambiente e com grau máximo de insalubridade para o trabalhador. O limite de exposição ocupacional ao mercúrio recomendado pela NR-15 é de 40 μg/m3 para uma jornada de trabalho de até 48 horas semanais (Brasil, 1978). Já a American Conference of Governmental Industrial Hygienists (ACGIH) preconiza como segura uma exposição média de 25 μg/m3 para uma jornada de trabalho de até 8 horas/dia e 40 horas/semana. Recomenda também um valor-teto para essa exposição de 30 μg/m3, o qual não deve ser ultrapassado em nenhum momento da jornada de trabalho, mesmo que a concentração média ponderada em 8 horas esteja dentro dos limites de exposição recomendados pelas agências reguladoras.(1)

O armazenamento inadequado das sobras de amálgama nos consultórios odontológicos também é um aspecto amplamente apontado na literatura científica como importante fonte de contaminação ocupacional e ambiental por vapor de mercúrio. Segundo a OMS, os resíduos sólidos de saúde, em que se incluem os derivados do amálgama dentário, constituem um potencial reservatório de contaminação biológica e química, tanto para o paciente quanto para o profissional e a população em geral.(1)

Para o controle da exposição ocupacional ao mercúrio, é importante desenvolver um programa de vigilância toxicológica no qual deve ser feita a quantificação da concentração da substância química presente no ambiente (monitoramento ambiental) e/ou no organismo (monitoramento biológico), cujos resultados contribuem para o diagnóstico da situação associada à contaminação e à implantação de medidas corretivas. A avaliação da exposição pode ser feita por meio da utilização de indicadores biológicos, também chamados de biomarcadores, parâmetros que refletem o comportamento e as interações ocorridas entre o agente tóxico e o sistema biológico. 

Para testar a exposição crônica ao vapor de mercúrio metálico (como na Odontologia) o biomarcador indicado é a urina, pois a concentração do metal nesse fluido biológico tem relação direta com a concentração ambiental à qual o indivíduo foi exposto. O valor de referência (VR) para a população em geral, não exposta ocupacionalmente ao mercúrio, é de 5 μg/g de creatinina. Já o índice biológico máximo permitido (IBMP) para o mercúrio metálico, nível a partir dos qual se aumenta consideravelmente o risco de adoecimento, é de 35 μg/g de creatinina. No entanto, o nível mais confiável de correlação entre exposição e excreção urinária só pode ser obtido após um ano de exposição contínua a níveis constantes de mercúrio no ar, fator que deve ser levado em consideração na análise dos dados. Porém, ainda que existam valores de referência considerados seguros para exposição ao mercúrio, uma avaliação mundial sobre esse metal feita em 2005 pelo Programa de las Naciones Unidas para El Medio Ambiente (PNUMA) demonstrou que trabalhadores expostos a níveis atmosféricos prolongados de 20 a 30 μg Hg/m3 ou níveis urinários de 30 a 35 μg Hg/g de creatinina já começam a apresentar efeitos adversos sutis no SNC e nos rins. Além disso, vários autores argumentam que os limites de exposição não levam em consideração fatores individuais que podem influenciar na resposta à exposição.(1)

Diante do exposto e, considerando-se que a exposição ocupacional ao mercúrio pode resultar em contaminação dos cirurgiões-dentistas e equipe auxiliar-técnica, fica evidente a importância e a necessidade da avaliação regular dos níveis de contaminação por mercúrio dos profissionais do setor odontológico e do ar do ambiente onde eles trabalham. É fundamental mapear e avaliar o processo de trabalho desses profissionais, na tentativa de identificar possíveis falhas no manuseio do mercúrio, a fim de eliminá-los ou minimizá-los. Os riscos que o mercúrio oferece aos cirurgiões-dentistas e aos demais trabalhadores da área odontológica não podem ser ignorados.

É fato que, apesar da controvérsia com relação ao mercúrio e as possíveis consequências negativas de sua utilização, bem como da deficiência estética do amálgama, ainda não existe na área da Odontologia desenvolvimento tecnológico que permita a suspensão completa do uso desse produto, ou seja, não há material que possa combinar a estética das resinas compostas com as propriedades mecânicas do amálgama. Dessa forma, o amálgama de prata mantém sua importância dentro da Odontologia, sendo mundialmente utilizado no tratamento restaurador de dentes posteriores.(1)


Como armazenar os resíduos de amálgama?

1- Coletar os resíduos de amálgama em recipiente dotado de boca larga e de material inquebrável. Deixar uma lâmina de água sobre o resíduo. Manter o recipiente hermeticamente fechado e em local de baixa temperatura, isento de luz solar direta; 

2 - O resíduo de amálgama, para ser armazenado, deve estar isento de algodões, gazes, palitos, lâminas de matriz de aço e quaisquer outros tipos de contaminante. Armazenar os resíduos de amálgama de tal forma, que sua recuperação seja menos dispendiosa e mais rápido possível; 

- Os vidros que contém o mercúrio, bem como a tampa e o batoque, devem ser enviados para uma empresa de reciclagem a fim de ser tratados e eliminar possíveis contaminações com mercúrio;

4- A borracha, do isolamento absoluto, deve ser descartada como material cirúrgico e deve evitar sua contaminação com mercúrio;

Em casos de remoção de uma restauração de amálgama os cuidados a serem tomados são:

1- Uso obrigatório de isolamento absoluto; 
2-  Uso de brocas novas para cortar mais rápido e gerar menor aquecimento; 
3- Uso de água gelada no reservatório da alta rotação, pois se a temperatura for abaixada, menos mercúrio é emanado da restauração; 
4- Uso de máscara na equipe de profissionais; 
5- Uso de óculos, inclusive, no paciente;   
6- Uso de sucção de alta potência durante o processo de remoção da restauração para que o mercúrio emanado não entre em contato com as pessoas e permaneça no consultório

Quebra de frascos de mercúrio: O que fazer?

1 - Ventilar a sala abrindo as janelas; 
2 - Interditar a sala até que todo o mercúrio derramado seja removido; 
3- Caso o mercúrio caia no piso, removê-los com uma folha de papel bem fina ou com uma seringa Luer e depositá-los no recipiente que contém os resíduos de amálgama. Use luva para a operação; 
4- Lavar o piso com água e sabão e em seguida encerá-lo. A cera impede a retenção do mercúrio no piso; Após esses cuidados, a sala pode ser liberada para uso. 
5- Caso ainda perceba resíduos de mercúrio, repita a operação. 

NOTA: O mercúrio do piso pode aderir à sola do sapato e, assim, pode ser transportado para outros locais e expor outras pessoas aos efeitos tóxicos deste produto.

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